Livro: "Ninguém Foge da Vida" de Carlos Henrique de Oliveira

Título: Ninguém foge da vida

Autor: Carlos Henrique de Oliveira

Editora: Editora Vida & Consciência

Ano de publicação: 2015

Gênero: Romance espírita, Segunda Guerra Mundial, Perseguição aos Judeus, Racismo, Xenofobia, Perseguição Religiosa

ISBN: 978-85-7722-435-7

Páginas: 372

Sinopse:
Nascida em uma tradicional família paulistana e descendente de alemães, Carolina desafia os ditames sociais ao assumir seu amor por um jovem negro e pobre em plena década de 1930.
A família da moça não aceita o relacionamento, e ela é obrigada a ir viver na Europa, em meio à Segunda Guerra Mundial. Lá, conhece um casal de judeus, que, perseguido pelos nazistas, se vê obrigado a entregar o filho pequeno à jovem, restando a ela fazer tudo o que estiver ao seu alcance para proteger o menino. Uma história sobre afeto, perdão, preconceito e sobrevivência do espírito, que ensina que o amor é capaz de superar todos os obstáculos, no emocionante romance de estreia de Carlos Henrique Oliveira. 


Nota:



Diagramação, curiosidades e particularidades:

A capa é muito bonita, em papel que brilha um pouco quando se quer fotografar (dá pra perceber pela imagem,né?) e com duas orelhas laterais na capa e na contra capa, a primeira apenas com a continuação da imagem do trem e uma mensagem, e a segunda com dados sobre o autor.

O verso da capa é maravilhoso, pois a imagem dos trilhos do trem que esta na primeira página vai se tornando mais clarinha até sumir na orelha da capa. Um trabalho muito bonito de se ver! A segunda folha também tem uma imagem (desta vez das malas da protagonista) e faz o mesmo tratamento para a página anterior (com o ISBN).

Todo o cuidado e carinho que a editora Vida & Consciência dedica as suas obras vem me cativando, sabe? Não importa o autor, eles fazem para todos os livros um trabalho de primeiríssima linha, que engrandece ainda mais a obra.

A página do sumário e a que abre o "prólogo" também trazem tratamento diferenciado, ganhando laterais em tons dourados.

Já, a diagramação em si, trás capítulos bem demarcados, com uma letra mais elaborada na demarcação do capítulo e do título do capítulo em si, A fonte do corpo do texto é grandinha, já pensando nas pessoas de mais idade que gostam de ler livros da temática espírita, mas que não possuem uma vista mais cansada do tempo. Eu, particularmente, gosto muito dessas letras maiores, pois descansam a vista e mesmo em páginas brancas, como é o caso deste livro, não tornam a leitura cansativa.


Resenha:

Eu nunca havia lido nada do autor Carlos Henrique de Oliveira, e já vou começar fazendo o "mea culpa" e confessando que pedi o liro para troca pelo Plus porque achei a capa maravilhosa. A sinopse parecia normalzinha e acabei até deixando o coitadinho de lado um tempo. Mas quando fui ler... meu Deus! Que livro mais lindo!

A cada momento, durante a leitura, estava eu fungando ou relendo trechos por serem muito profundos e dignos de nota. Aliás, eu acabei marcando alguns para colocar nesta postagem, embora eu não tenha nunca feito dessas, mas é que este livro me marcou tão profundamente que não havia saída. E, aliás, a trama dos personagens secundários são ainda mais mortificantes do que o próprio enredo principal em muitos momentos.

A trama começa na década de 30, durante os anos em que Hitler começa a sua louca jornada de ódio e controle na Alemanha, aproveitando-se das sanções econômicas que a Alemanha sofreu após a Primeira Guerra Mundial, e fazendo uma verdadeira lavagem cerebral no povo alemão com seu discurso que tentava exaltá-los e colocar em suas mentes que eles não deveriam baixar a cabeça para ninguém, por serem melhores que o undo todo.

Enquanto a coisa começa a pegar fogo do lado de lá, a trama começa na capital paulista, aqui no Brasil mesmo. Onde a jovem Carolina, uma moça de família abastada, se apaixona por um jovem negro, Heitor, que serve o exercito junto com seu irmão, Ulisses.

Embora Ulisses aprove o namoro da irmã, já que Heitor é seu melhor amigo e tem as melhores das intenções, ele sabe que a coisa toda não será fácil para eles ficarem juntos, e os ajuda a darem uma escapadinha para ficarem juntos sem que a família da moça saiba.

Demóstenes e Hilde são os pai de Carolina e Ulisses. Ele, brasileiro, nem descendência mencionada, embora sua mãe Maria Lúcia chegue a comentar em determinado momento que ela foi filha de ricos fazendeiros que possuam escravos pode não concordar com o envolvimento da filha; mas Hilde que é descendente de alemães, e mesmo fora da Alemanha está muito por dentro da filosofia "higienista" nazista, não pode nem imaginar que a filha tenha um romance interracial.

Aliás, quando o rapaz decide pressionar a moça, que esta receosa por conhecer bem seus pais, e pedir sua mão em casamento, ele é esmurrado pelo pai dela após ouvir todo tipo de ofensa racista dita pela mãe dela. Ulisses chega até a pedir para o amigo que desista de sua irmã para não sofrer mais, mas o amor dos dois é grande e eles não querem se esquecer.

Carolina é mandada para uma fazenda da família e recebe fiscalização constante de sua mãe e avó. A avó, alias, lhe confessa que na sua própria juventude se apaixonou por um negro, mas não teve coragem de afrontar aos pais, já que em seu modo de ver (e de todas as mulheres desta época em questão) mulheres são propriedades de homens, primeiro como filhas e depois como esposas, elas não são livres para decidir nada e não podem fazer coisa alguma para decidir seus destinos.

A senhorinha até tenta ajudar, tentando fazer com que o filho entenda que o melhor seria casar aos dois, mas não há nada que o faça mudar de ideia. Aliás, Hilde acaba desconfiando da gravidez da filha e a faz tomar um chá abortivo, o que faz com que os país mandem a moça logo para o exterior estudar (uma pequena concessão a favor da moça que sua avó conseguiu por ela) e se casar com um oficial do exercito alemão, Ernst, ao se formar.

Carolina se entristece por um futuro tão triste em seu horizonte,mas não quer perder as esperanças de um dia poder reencontrar seu verdadeiro amor. Já na Holanda, ela começa a estudar Filosofia em uma universidade, enquanto fica sob os cuidados de amigos de Maria Lúcia, mas logo acaba fazendo amizade com um casal de professores judeus, o que irrita seu futuro marido, que não quer engolir o desaforo e descobrirá uma forma de vingar-se.

Temos que levar em consideração que a trama começa antes de os judeus serem mandandos para o campo de concentração, então o livro todo vai passando por essas passagens temporais e o autor soube usar muito bem informações verídicas e mesclá-las com a trama, o livro é de uma riqueza de detalhes tremenda, que trata desde o começo, onde judeus são cadastrados pelo governo, obrigados a andar com uma estrela de Davi em suas roupas, trafegar apenas pela calçada e comprar nos mercados apenas após um determinado horário, até que o Holocausto em si comece a acontecer.

Mas, meus amigos, a coisa não para por ai não. Esses professores tem um filho e é a Carolina que essa criança é confiada quando eles veem que serão pegos de qualquer forma, que não haverá escapatória. Sendo assim, a moça começa uma corrida contra o tempo para resgatar o menino e levá-lo para longe de seu "noivo", o que a leva a conhecer a Resistência e ser ajudada por um casal de alemães homossexuais contrários ao regime nazista.

Há um monte de frases e momentos marcantes no livro, com frases que nos fazem pensar sobre as visões da homossexualidade no espiritismo, bem como questões raciais. Minha vontade era compartilhar páginas e páginas inteiras com vocês, mas deixo-lhes com alguns trechinhos a seguir que certamente aguçará a curiosidade de vocês:

  • "Mal sabiam que o machismo é a inferiorização da mulher, o tratamento dispensado à elas como se fossem empregadas ou destinadas a servir aos homens, obedecendo-lhes cegamente e sofrer todo tipo de violência psicológica e física era uma ilusão criada pela sociedade e não estavam nem um pouco de acordo com as leis de amor que reagiam o universo. Esse é um erro de pensamento terrível da civilização humana, que precisa ser corrigido" (p 138)
  • "O nosso espírito imortal não tem sexo e pode pode transitar entre um sexo e outro outro durante as encarnações. Nessas transições pode sim lhe ser concedido a vivência em corpo físico diferente do sexo psicológico, da sua identidade sexual ou, ainda, nascer com o desejo sexual e afetivo pelo mesmo sexo, por expiação ou por missão. Mas, com esse individualismo e esse ódio que vêm assolando-se há séculos nossa sociedade, e com o preconceito cada vez mais na moda, as pessoas negam-se a enxergar a perfeição de Deus em tudo que existe" (p 165)
  • "Não devemos rotular e impor intolerância à diversidade de comportamentos, que é uma lei natural, presente em todos os aspectos da natureza. A diversidade está presente na natureza e na vida humana por meio das inumeráveis diferenças culturais existentes entre os povos, enfim, o universo é vasto e possui condições de vida que nossa inteligência anda nem consegue vislumbrar. Ser homossexual é um estado transitório do espírito, da mesma forma que a heterossexualidade, com raiz em vidas anteriores e experiências do espírito. Ambas são condições inconscientes, que nascem com o espírito e representam preciosa experiência de aprendizado que precisam ser vivenciadas com dignidade, caráter, respeito, amor a si mesmo a ao próximo" (p 190)
  • "Alguns espíritos extremamente preconceituosos nascem homossexuais para expiarem o preconceito a que infringiram" (p 190-191)
  • "Espíritos cultos e sensíveis podem escolher essa experiência [a homossexualidade] para missão, para desvencilhar-se do sexo ou para servirem de exemplo moral e afetivo aos demais que estão na mesma faixa de prova. Um dia, meu amigo Saulo, a humanidade vai entender que o homossexual, o bissexual e o transexual podem ter uma vida social e afetiva de maneira respeitosa, digna, pautando-se na lealdade, no respeito, na responsabilidade, no compromisso e no amor, assim como devem ser pautadas as relações entre os heterossexuais." (p 191-192)
  • "Vejo que em vez de viver consciente e responsável por si, a maioria prefere eleger culpados por todas as desgraças que lhe acontecem, passando a persegui-los. Era assim na Idade Média, quando consideravam que a sodomia causava todas as catástrofes que envolviam a sociedade. Isso é um franco desejo de isentar-se da responsabilidade por si, colocando-se a culpa das desgraças nos outros" (p 194) 
  • "(...) há um preconceito muito disseminado em grande parte dos povos, principalmente pela má interpretação das crenças religiosas (...). Muitos espíritos ignorantes pensam que, ao agredir, humilhar e punir o homossexual por ele, a seu ver, cometer um ´pecado´, sentem-se mais elevados e acham que estão reduzindo o próprio débito moral que acreditam possuir no sexo. Outras têm medo de elas mesmas serem homossexuais ou de outros pensarem que elas sejam e, por isso, saem agredindo aos que se assumem como são, muitas vezes por inveja. (...) É importante frisar que a homossexualidade não precisa de cura, por não ser uma doença." (p 194-195)
  • "O homossexual não se torna infeliz por ser homossexual. Ele apenas é infeliz quando não entende ou não aceita a sua condição, sua orientação sexual, quando não tem a resignação desenvolvida, ou ainda quando é pessimista e incrédulo, vendo apenas o lado ruim das coisas, apenas a perseguição e o tormento provocados pelo preconceito. Quando as pessoas não se aceitam da forma que são, quando não acreditam no potencial divino que existe dentro delas, em seu eu superior, geralmente acabam agredindo a si mesma, punindo-se, e às vezes, estendem essa agressão ao próximo" (p 195)
  • "A raiva é um veneno que atinge apenas quem a sente" (p 209)

Comentários

  1. Adorei a resenha!
    Nunca li romances espiritas, mas meu desejo de começar só aumenta! Tenho "Laços de Familia" da Zíbia aqui em casa para ler, sabe se é bom?

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    1. Obrigada Fábio!

      Então, eu li "Laços de Família" e (olha o momento vergonha) não resenhei ele ainda, por conta de uns probleminhas particulares, mas pretendo fazer isso sim.

      Aliás, ele até saiu com uma capa nova,muito bonita, e foi esta nova edição que eu li, mas creio que o texto seja o mesmo.

      Ele é interessante sim, é a história de uma família, onde a mãe e o pai se casaram e são muito pobres e tem vários filhos (acho que 4, se me lembro bem, é que ele está emprestado, então não vou poder conferir), mas vivem em uma fazenda e passam muitas dificuldades.

      A mãe, aliás, é muito bonita e tem um homem que sempre fica tentando presente-la. Mas, num dado momento, ela se toca o como aceitar tais presentes (mesmo eles sendo muito pobres) pode dar uma ideia errada aos seus filhos e começa a recusar.

      Das crianças, a menina mais velha tem que ajudar a cuidar dos irmãos, e ela acaba tomando para si quase que a obrigação de mãe, deixando até de comer e vestir para que os mais novos tenham as coisas. Isso é bem triste, ela é bem abnegada e isso leva ela a morte (aliás, livro espirita sempre tem a morte de alguém, então não é spoiler, pois é fato, ehehehhehe).

      Sem a irmã, um dos meninos acaba meio que assumindo o lugar que cuidar de todos, e isso faz com que ele queira sair dessa vida de pobreza e conseguir dinheiro para sustentar a todos, o que agrada um dos pais que quer ir junto, mas desagrada o outro que acha um absurdo.

      Tudo na vida deles vai se desenrolar meio que a partir daí. Aliás, nesse livro é até mais evidente o porque de eles terem nascido juntos nessa vida, pois é explicado o que eles fizeram na vida anterior, sabe? E o que levou eles a se encontrarem nessa.

      Eu recomendo ele sim, e pretendo fazem em breve a resenha certinho, só preciso pegar ele de volta para rever algumas coisas e tirar as fotos :D

      Me conta depois o que achou dele :D

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    2. Opa, me deixou animado para ler!
      O que mais gosto nos livros do gênero (mesmo não tendo lido nenhum ainda) é essa complexidade de explicar os personagens pelas vidas passadas. Acho tão inteligente quando utilizam isso! Quero muito aprender mais sobre, e tenho uma amiga com a biblioteca cheia de romances espiritas... ai já viu né haha

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